terça-feira

Livro: Jardim do Éden de Odair Comin

Romance de Odair Comin

Trecho do livro Jardim do Éden

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“Mas porque então te combatem tanto, porque rezamos para um Deus nos proteger de um Demônio. O próprio homem o teme, as religiões o temem. E como Deus e o homem unidos não te vencem. Que poder é este que tens?”
O Diabo gargalhou num regozijo de prazer e ironia.
“A única coisa que mantém as religiões em alta é a minha existência, a existência do chamado mal. Portanto, ninguém quer acabar comigo, apenas me difamar, como dizem, pintar literalmente o diabo mais feio do que realmente é. Sem mim as religiões não teriam nenhum sentido, se extinguiriam como o pó jogado ao vento. Elas se alimentam do mal, como corvos da carne pútrida; por conseguinte, os fiéis também seguem o mesmo caminho. Buscam enfatizar que o mal está em todos os lugares, que precisa ser combatido. Essa busca cega os faz ver miragens. O mal ocupa todos os espaços de suas mentes. Lutam contra o mal, não são tão motivados para lutar a favor do bem. Fogem do mal, mas tudo o que conseguem é cair em seus braços. Para manipular as massas é preciso temperar suas mentes com o medo, com a possibilidade de um demônio sempre a rondar. O medo é a mais forte das cordas que mantém o homem preso às religiões. As igrejas estão cheias de arrependidos, percebe-se que já fizeram muita maldade, muita coisa errada antes de estarem ali. É muito simples, podes cometer pecados a vontade, basta se arrepender depois. Se Deus tudo perdoa, logo pode-se fazer tudo. Dizem que sou as trevas e Deus a luz, que sou a morte, Ele a vida. Ambas caminham juntas, uma fazendo parte da outra. A morte não é o oposto da vida, é ausência de vida. A escuridão não é o oposto da luz, é ausência de luz. Não sou o oposto de Deus, sou a ausência dele. Ele só pode ser onipresente com minha ajuda. E quem não fica feliz em ver a luz depois de passar um tempo nas trevas? Sou o arauto rechaçado de Deus. Somos dois lados da mesma moeda. Se Deus fosse onipresente no paraíso, como poderia eu entrar neste espaço sagrado? Só entro pelas portas que me são abertas”.